quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Um choque de realidade...

7 de setembro
Um choque de realidade...
Após uma noite revigorante e um laudo café, o guia nos buscou no horário marcado e nossa primeira visita foi próxima do hotel, ao Boudhanath.

Este é um dos locais budistas mais sagrados em Kathmandu. Desde 1979, é um patrimônio mundial da UNESCO, e um dos mais populares pontos turísticas na área da cidade. Há, em torno do Boudhanath, uma porção de lojinhas de artesanato,

assim como vendedores de cal (eles vendem uma bacia de cal, vc leva prá abençoar na roda de reza (são uns cilindros que vc toca e gira, alguns grandes, outros pequenos), e depois vc devolve o cal.

Este cal (dizem eles) é usado para anualmente caiar o Boudhanah, que sempre tem que estar caiado e limpo. O sentido de limpeza, entretanto, é bem diferente do nosso. Quanta sujeira! Qto lixo espalhado. Eu pensei que já havia visto tudo o que é possível em termos de sujeira, mas sem dúvida nenhuma, Kathmandu é a cidade mais suja que já vi na vida. Aqui, a sujeira e a pobreza são um estilo de vida. Isto porque os hindus acreditam que, se vieram ao mundo do jeito que vieram, é para manter a situação como está, pois do contrário Budha os teria enviado de outro jeito. Isto explica, certamente, um pouco da letargia reinante, que talvez também possa ser provocada pela marijuana (que é consumida livremente, mas não pode ser comercializada) e as piras de incenso, que continuamente exalam um cheiro que deixa a gente até meio zonza. Entramos em dois templos budistas, um antigo e um novo, mas confesso que não vi diferença entre os dois, pois ambos estão mal conservados e sujos. Há muitas pessoas que rezam, que tocam as rodas, os sinos, os totens com deuses hindus.  



A esta altura do campeonato, já estávamos ensopados. Não é que estava particularmente quente, mas extremamente úmido. A poluição do ar é um problema sério em Kathmandu. Além da degradação humana óbvia produzida pela indústria, pelo trânsito absurdo (é uma tremenda confusão, businas por todo lado – no final do dia tinha vontade de esganar quem buzinasse – carros prá tudo que é lado, mas supreendentemente, uns deixam passar os outros, e há poucos acidentes) e congestionamento extenso na cidade há também a queima nos templos e cremações públicas.
Em seguida, fomos para Pashupati – o templo do senhor dos animais
Este santuário é dedicado a Shiva. O templo é tão importante para os devotos a ponto de se referirem a Kathmandu como ‘a terra do templo de Pashupati’.Ele fica às margens do rio Bhagmati.
Há um conjunto de pequenos templos, estátuas e imagens de deuses hindus. Existem também numerosos santuários, ao ar livre, espalhados por todo lugar, erigidos em diversas épocas, por personagens importantes do reino.





Os degraus (ghats) que levam às águas do rio são usados para banhos rituais e de purificação. Há plataformas de pedra, onde se fazem as cremações dos corpos e de onde, no mesmo rio em que se banham, são lançadas suas cinzas.

Vimos a cremação de vários corpos. Esta foi uma vivência altamente impactante.

 Ver o corpo todo enrolado com tecidos coloridos colares e oferendas, em cima de vários pedaços de madeira, cobertos por um tipo de cizal. Há uma pessoa que comanda a cerimônia toda, e a cremação dura cerca de três horas. As pessoas ficam assistindo à queima do corpo,  e vimos uma mulher chorando dramaticamente a morta que estava sendo queimada. Toda a área é coberta por uma fumaça que vem destas queimas, e confesso que, durante algum tempo, senti o gosto da fumaça na boca (com a sensação de que estava sentindo o gosto de carne queimada – grrrr). O cheiro da fumaça impregna na roupa, tanto que lavei toda ela quando retornei ao hotel. As pessoas em luto usam panos brancos, e durante um ano usam roupas brancas. Fiquei impressionada com o fato de que jogam tudo na água. Quantas cinzas de corpos queimados estas águas já não receberam no decorrer dos séculos?????????? E as pessoas se banham nesta água. Realmente, uma cultura muito diferente, difícil de entender.

No local podem ser vistos sadhus, homens que dizem que são santos, que vêm de diversos locais do país e ficam sentados em diversos lugares do templo, à espera de donativos dos milhares de devotos que por ali transitam. Confesso que fica difícil entender que são santos, porque te abordam constantemente querendo tirar fotos com vc em troca de dinheiro (que já é previamente estipulado: 100 rupias). Não tive nenhuma vontade de tirar fotos com eles.
Há, também, uma profusão de macacos.

No meio desse amontoado de seres reais e fantásticos, ergue-se o Templo do Senhor dos Animais, local de peregrinação para hindus, desde todo o Nepal até o sul da Índia.

Visitar este local é um grande desafio, pois entramos em contato com duas faces do existir: a beleza e a sujeira. Elas se encontram na nossa frente e nos ensinam a fazer uma reflexão sobre nossos valores e a maneira com a qual olhamos o mundo. E nos faz perceber que a escolha do que ‘ver’ é nossa.
Seguimos para Bhaktapur pela única estrada de asfalto que existe no Nepal (construída pelos japoneses), e que leva para esta cidade. Esta cidade fica no Vale do Nepal, rodeada por montanhas (não deu prá ver muita coisa, pois o dia estava nublado e úmido) Foi fundada em 865. Durante 200 anos foi assentamento importante no vale. Existe uma república somente há três anos. O rei, surpreendentemente, abdicou e entregou o governo. Há 601 representantes no parlamento. O presidente pertence ao partido comunista.  Andamos por inúmeras ruelas. No percurso choveu, parou de novo, voltou a chover... até chegarmos ao Templo do Sol, um grande complexo de templos.







Já no meio da tarde voltamos a Kathmandu. Fomos ao centro.
Visitamos as imediações do velho palácio em Durbar Square foi construído em 1700 e tem belas esculturas de madeira e uma porta de entrada finamente trabalhada em dourado. Não dá prá afirmar, entretanto, que está sendo bem conservado, como tudo que vimos até agora. Vimos incontáveis templos, palácios, mas tudo parece estar caindo aos pedaços. Se realmente uma boa parte da economia provém do turismo, o governo deveria ter mais cuidado com os bens históricos do país.




Passamos por ruas e ruelas de comércio, com um profusão de gente, incontáveis lojinhas que oferecem de tudo, ambulantes persistentes que tentam vender objetos a qq custo – chega a cansar de tanta abordagem. Esta abordagem insistente faz vc perder toda e qq vontade de adquirir alguma pachmina, ou objeto de lembrança do Nepal.
Foi um dia extremamente intenso e exaustivo. Foi um choque de realidade. Kathmandu deixou de ter, para mim, aquele fleur romântico de cidade zen, onde as mulheres vestidas de sari flanam pelas avenidas (que praticamente inexistem) acompanhados de seus maridos vestidos de túnicas.
O que a gente viu foi o contraste entre beleza e sujeira, foram rostos cansados da lida de todo dia, da falta de dinheiro, da falta de emprego, da falta de perspectiva. Penso que muitas pessoas refugiam-se no hinduísmo e budismo para poder abstrair, para fugir da dura realidade, pois é só com muita fé, e esta sem dúvida as pessoas tem, é possível suportar uma vida com tantas carências.

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